Criô apresenta Roda Viva, de Chico Buarque, na Casa da Ribeira, em Natal/RN, no dia em 4 de agosto de 2024. Foto por Lili Glück
14/10/2024 | Por Marlos Ápyus

Que bom que você passou por aqui

Eu já havia me emocionado com a performance de Sarah Kay e Phil Kaye para ‘When Love Arrives‘ quando a versão em português de Rayssa Bratillieri e Anthony Garcia me levou aos prantos. Pode ter sido a familiaridade maior com o idioma nativo. Mas certamente a fragilidade do segundo momento contou pontos — eu tinha acabado de ser devida e dolorosamente desligado da empresa à qual me dedicava havia três anos.

É um poema sobre o amor. Mas, noutro plano metafórico, enfatiza a finitude dos ciclos. Neste sentido, talvez acrescente pouco ao que Tom Jobim e Vinicius de Moraes oferecem com ‘A Felicidade‘, ou mesmo ao que Lulu Santos nos presenteia com ‘Como Uma Onda‘. Estão lá: a tristeza como um alicerce resistente; a felicidade como um frágil telhado de vidro que se despedaça à primeira pedrada; e a vida como uma sequência de ondas que vêm e vão. Mas Kay e Kaye — falando assim, pareço íntimo, mas nada sei deles além do que o ChatGPT me explicou há pouco — vão além, e propõem uma resposta às tais adversidades. No caso, a gratidão pelos bons momentos que as antecedem.

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Cena de Despertar da Primavera recriada pelo Criô na Casa da Ribeira em 4 de agosto de 2024 | Foto: Brunno Martins
24/10/2024 | Por Marlos Ápyus

Eu e a música

A morte do meu pai é, com folga, o episódio mais traumático da minha vida. Quis o destino que, aos 9 anos de idade, eu estivesse ao lado quando um AVC o fez sofrer fortes convulsões. E que coubesse a mim e à caçula corrermos pela vizinhança atrás de um socorro que de pouco adiantaria. Entre o derrame e a notícia da morte, passaram-se 5 dias de poucas novidades. Exceto pelo “Marina, morena Marina, você se pintou” que ouviram nos corredores do hospital pouco antes do coma profundo. Assumimos que, num momento daqueles, a opção por cantar seria um sinal de que ele estava e ficaria bem. Não imaginávamos que, na verdade, alucinava, algo que só nos seria esclarecido após a constatação do óbito. Ainda assim, gosto de acreditar que o melhor pai do mundo morreu reprisando o que fazia nos momentos de maior felicidade. E justo com uma de suas canções preferidas. Quantos podem se dar a esse luxo?

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